A fábrica de sonhos pode ser também uma fonte de pesadelos na vida real
Por Edilson Pereira
No meu último livro, “Assassinato no Central Park” (Editora Baskerville, 364 páginas, 2019), refiro-me como exemplo de crime não resolvido à morte de Thelma Todd, atriz de sucesso em Hollywood nos anos 30. Ela está na primeira versão de “The Maltese Falcon”, de 1931, no breve papel de Iva Archer. E linda ao lado de Chico Marx em “Horse Feathers”, de 1932, na cena em que ele mostra habilidades com o piano. Ele esbanja talento; ela esbanja beleza. A história pessoal de Thelma tem mais mistério, tensão e intriga, fundamentais para uma boa fita, que qualquer de seus cento e vinte filmes. Thelma não queria ser atriz. Sonhava em ser professora.
Alice Todd, mãe ambiciosa da moça, tinha outros planos. Enfiou a garota em concursos de beleza para ser vista por caçadores de talento. Ela foi Miss Massachusetts e pavimentou o caminho para Hollywood, onde virou uma das queridinhas dos estúdios. A coisa ia bem até que no dia 16 de dezembro de 1935, segunda-feira. Mae Whitead, empregada negra de Thelma, abriu a porta da garagem e a encontrou morta no carro. O corpo atrás do volante inclinado em direção da porta. A perícia de Los Angeles constatou que a atriz morreu às quatro horas da tarde anterior envenenada por monóxido de carbono emitido pelo escapamento do veículo.
O júri concluiu que foi suicídio e pediu mais investigações. Elas foram feitas por quatro meses e não se chegou à nenhuma conclusão. A imprensa apontou para assassinato. E tinha suas razões. Thelma estava com nariz arrebentado, hematomas em volta da garganta e duas costelas quebradas. Não é uma forma muito comum de suicídio. O certo era que a atriz conhecida como Anjo Loiro dos anos trinta morreu com 29 anos. E deixou a pergunta: “Quem matou Thelma Todd?” A lista de suspeitos tinha todo tipo de gente. Dos mais variados perfis. A começar pelo ex-marido da atriz.
Pat DiCicco tinha conexões com o submundo do crime. Ele a espancava e ela se divorciou. O assassino podia ser Roland West, diretor fracassado e amante de Thelma. Ele e a mulher eram sócios da atriz no Thelma Todd’s Sidewalk Cafe. Os três parceiros viviam em um duplex acima do restaurante. West não gostava dos casos de Thelma e era potencial assassino. A mulher, também. Jewel Carmen era dona da garagem em que a atriz foi encontrada morta e não se opôs à ligação do marido com a sócia até o restaurante dar prejuízo. Aí ameaçou matar Thelma por perder dinheiro. Mais dois suspeitos despontam na lista: o mafioso e psicopata Lucky Luciano, do ramo de prostituição, jogos e extorsão em Los Angeles. Ele teve caso tempestuoso com Thelma e gostava de espancar mulheres e homens. O cara queria usar o restaurante dela para jogos ilegais. Ela se opôs. Ele ficou uma fera.
E, finalmente, Alice Todd, mãe de Thelma. A velha era suspeita. Além de manipuladora e interesseira, estava de olho gordo na herança da filha, que não era pequena. Muitos suspeitos. Nenhum condenado. Todos safaram. O mistério continua até hoje. A morte de Thelma Todd não é caso isolado em Hollywood. Revela a face sombria da indústria cinematográfica. Que manda para debaixo dos tapetes da história o que não interessa. A fábrica de sonhos também produz tragédias como as de Carole Lombard no dia 16 de janeiro de 1942. O avião da moça se chocou contra uma montanha. Ou de James Dean, que fez o clássico “Juventude Transviada” e morreu aos 24 anos num acidente com o carro em 30 de setembro de 1955. Outra morte estranha foi a de Brandon Lee, filho de Bruce Lee, que levou tiro acidental em trinta e um de março de 1993 quando filmava “O Corvo”.
No entanto, quando há a suspeita de assassinato a coisa fica tensa. Como a morte de Marilyn Monroe em 5 de agosto de 1962. Foi morta ou se matou? Até o presidente John Kennedy entrou na lista de suspeitos. Mas ele morreu no ano seguinte. A morte de Sharon Tate em 9 de agosto de 1969, sobre a qual não paira mistério ou dúvida, também entra no pacote pela brutalidade e componente trágico. O mesmo ocorre com a morte de Lupe Vélez em 13 de dezembro de 1944. A bela mexicana teve caso devastador com Gary Cooper, antes de se casar com Johnny Weissmuller, o Tarzan, em 1933. O casamento durou cinco anos entre idas e vindas. Mas Vélez também levou para a cama Charles Chaplin, Errol Flynn e John Gilbert, partner de Greta Garbo, entre outros.
A lista de amantes é usada como argumento para os que acham que Vélez se suicidou. A versão que não desceu pela garganta de muita gente foi a de que ela se relacionou com o jovem ator Harald Maresch, engravidou e como era católica, não quis fazer aborto. Preferiu deixar este mundo com o filhinho no útero e um comovente bilhete de despedida. Andy Warhol, que dirigiu o filme “Lupe”, sugere que ela teve overdose, ficou com náusea e foi vomitar na privada. Escorregou, enfiou a cabeça na privada e se afogou. Outra versão revela que ela escorregou e bateu com a cabeça no sanitário. A fixação pelo sanitário não faz sentido se levar em conta que Beulah Kinder, secretária da atriz e primeira a encontrá-la morta, revelou que ela estava descansando pacificamente em sua cama. A privada suspeita não estava por perto.
Rosa Linda Fregoso, professora e ex-presidente de Estudos Latino-Americanos e Latinos da Universidade da Califórnia, ri da versão de suicídio. Vélez era conhecida por desafiar convenções morais da época, sendo improvável que ficasse abalada com gravidez indesejada. Opinião que só aumenta o mistério e não esclarece nada. Sal Míneo, outro que fez “Juventude Transviada” e primeiro ator a assumir publicamente a bissexualidade, reforça a galeria de mortes violentas. Ele foi indicado duas vezes ao Oscar e morreu esfaqueado em doze de fevereiro 1976, perto do prédio em que morava em West Hollywood.
A baixinha Natalie Wood, que também esteve em “Juventude Transviada” ao lado de Mineo e Dean, morreu em 29 de novembro 1981. E entrou para o rol dos enigmas de Hollywood. Ela morreu afogada mas a polícia descobriu que não foi morte natural. O suspeito ainda é o marido Robert Wagner. Bob Crane, que ganhou o estrelato com a série para a televisão chamada “Guerra, sombra e água fresca”, morreu em vinte e nove de junho de 1978. Ele foi assassinado. Teve morte brutal. Foi espancado até a morte com um tripé. Mas quem o matou? O que se sabia era que Crane, apesar de representar bons moços na tela, e ser pai de família, tinha uma vida sexualmente devassa. Mas isto não esclarece nada.
A lista fica mais longa se incluir atores e atrizes que não alcançaram o estrelato. E, principalmente, se incluir mortes estranhas. Uma delas é a de Jean Harlow, em 7 de junho de 1937, aos 26 anos. A grande estrela loira dos anos 30 passou mal durante as filmagens de “Saratoga” e o diretor mandou-a para casa descansar. O que aconteceu depois é um mistério. Tem gente que acha que ela teve septicemia devido a extração de um dente do siso, mas aparentemente tinha problemas renais e não diagnosticados de forma correta. No atestado de óbito consta que morreu devido a aguda infecção respiratória, uremia e nefrite aguda. Mas que seus fãs acharam a morte estranha, suspeita e misteriosa, não paira dúvida.
Estranha mesmo foi a morte de David Carradine, eterno Kung Fu. Ele foi encontrado em 3 de junho de 2009 num quarto de hotel de Bangcoc. Estava nu com uma corda de náilon atada ao pescoço e aos genitais. Sua ex-mulher, Marina Anderson, contou que o ator tinha comportamento sexual perigoso. A teoria aceita é que Kung Fu morreu enquanto praticava uma vertente arriscada de masturbação. Não chegou ao orgasmo mas ganhou o paraíso. Ninguém além dele era suspeito.
Hiram Hollanda jr diz
Edílson, meu caríssimo Edílson. Parabens pelo belíssimo texto. Você nasceu na época errada.