Por Claudia Costa
Quatro famílias, quatro histórias de amor, dedicação e superação. De maneira geral, a sociedade brasileira conhece muito pouco sobre o Transtorno do Espectro Autista, popularmente conhecido por autismo. Há muitos anos, as famílias escondiam os filhos que apresentassem qualquer deficiência, fosse física ou mental. Era muito conveniente e cômodo para a sociedade, que não precisava encarar situações reais e não tinha que agir para melhorar a qualidade de vida dessas pessoas e de seus familiares. Felizmente os tempos são outros e as famílias expõem de forma positiva seus filhos e compartilham conosco suas conquistas, desafios e necessidades. A palavra inclusão está muito na moda, mas a sua amplitude é o que é relevante. Precisamos conhecer, conviver e exigir políticas públicas que contemplem todos os cidadãos. Pense: e se fosse seu filho, o que você faria?
O Portal Ideia Delas entrevistou alguns pais no Brasil e no exterior para conhecer as suas realidades e a dos filhos que têm Transtorno do Espectro Autista. Constatamos o quanto eles se dedicam, batalham e se orgulham dos filhos, suas pequenas e grandes conquistas. Não temos a pretensão de acabar com o preconceito, mas de apresentar a realidade dessas famílias e de sensibilizar as pessoas para esta questão, e com isso contribuir para uma maior inclusão por meio do interesse das pessoas em ajudar a causa dos autistas.
Gisele, Misael e o filho Vinicius Zemuner
O casal paranaense mora em Burlington, Estado de Massachusetts, nos Estados Unidos
A governanta Gisele Silva Zemuner, 50 anos, e o músico Misael Zemuner, 63 anos, são pais do jovem Vinicius Zemuner, 15 anos. O jovem nasceu nos EUA e possui dupla cidadania (brasileiro-americano). A família mora naquele país há 22 anos. Os pais são um exemplo de como transformaram suas vidas para cuidar e dar a melhor qualidade de vida para o filho que nasceu com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Por ser um cidadão americano, todo o tratamento do jovem, assistência em casa e as escolas são custeados pelo governo de Massachusetts.
“Ainda bebê, o pequeno Vinicius já apresentava alguns sinais que alertaram os pais. Ele realizava movimentos repetitivos, não fazia contato visual, não respondia quando era chamado pelo nome, era uma criança não verbal e também não brincava apropriadamente com brinquedos. Ele adorava carrinhos, mas, em vez de empurrá-los para fazê-los andar, Vinicius simplesmente ficava girando as rodinhas. Também não tinha nenhum interesse em crianças.
Com apenas 18 meses, mesmo não tendo um diagnóstico fechado mas com a suspeita de Transtorno do Espectro Autista, o nosso filho começou a receber em casa terapia individual precoce (ABA). Eu e o Misael tivemos que nos desdobrar para estar em casa para que o Vinicius pudesse receber quatro horas diárias de terapia. Isto após a realização de alguns exames clínicos como medição da audição, eletroencefalograma e por último um exame com uma médica psiquiatra infantil. Aos dois anos tivemos o diagnóstico. A partir disso, ele começou a receber 30 horas semanais de terapia individual em casa. Decidimos não ter mais filhos, pois os cuidados com nosso filho exigiriam muito de nós. Decidimos nos dedicar ao máximo e exclusivamente ao Vinicius. Também tivemos algum receio de que outro filho pudesse nascer com o problema. Todo tratamento dele, assistência em casa e a escolas são custeados pelo governo de Massachusetts.
Crianças com necessidades especiais começam a ir à escola com 3 anos para terem o máximo de suporte possível, e têm o seu próprio plano de ensino, plano individual do estudante. A cada três meses, a escola manda um relatório para que os pais saibam como seus filhos estão evoluindo. E a cada ano nos reunimos com diretor, professores, terapeuta ocupacional, fisioterapeuta e fonoaudiólogo para ver que metas do plano individual ele atingiu e quais metas continuaram buscando.
Vinicius irá frequentar a escola até completar 22 anos. E, apesar de todo o suporte que temos aqui, o futuro do nosso filho ainda nos assusta. Talvez o nosso Vinicius terá que viver em uma casa especialmente adaptada para adultos com autismo. Tenho certeza que ele será bem tratado com profissionais capacitados e, apesar de não ter irmão, os primos, tias, tios e amigos que nos ajudam a ter uma vida mais normal e feliz possível estarão sempre presentes na vida desse anjo onde ele estiver!”, Gisele Zemuner
Claudia Cassiano e o filho Théo
A advogada, de Presidente Prudente, dedica sua vida ao filho.
A advogada Claudia Cassiano, 52 anos, divorciada, é mãe de três filhos: Carla Mayumi, 32 anos; Caio, 26 anos; e Théo, 8 anos; e uma neta, Melissa. Ela recebeu a confirmação do autismo do filho em 2014, quando ele estava com apenas 4 anos, seis meses após a morte prematura do seu outro filho Caio aos 26 anos. Moradora de Presidente Prudente, cidade do interior de São Paulo, Claudia parou de trabalhar para se dedicar exclusivamente ao filho.
“Apesar da minha fragilidade, anteriormente, eu já havia percebido algumas coisas diferentes no comportamento do Théo desde bebê. Conforme ele foi crescendo, pude ter a certeza de que algo não estava indo bem, como o atraso na fala, o isolamento, a maneira sistemática de brincar, sua seletividade alimentar, a fixação por carrinhos. E o mais intrigante: era uma criança que, mesmo gripada, com febre, não manifestava desconforto. Percebia-se uma criança muito inteligente.
Eu buscava explicações pra tudo isso. Não conseguia entender tais diferenças em relação aos meus outros filhos. Procurei médicos e psicólogos para realizar exames, buscando entender por que o Théo era uma criança com comportamentos diferentes.
Recebi o diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista em setembro de 2014, quando Theozinho se encontrava com 4 anos. Talvez porque eu me encontrava e me encontro enlutada, minha reação diante desse sofrimento foi ter garra e vontade de ajudar meu filho em todos os aspectos.
Na minha trajetória com o tratamento multidisciplinar do Théo, percebo que há profissionais qualificados sim, mas são poucos e muito caros por encontrarmos apenas atendimento particular, pois o plano de saúde não tem cobertura. Quando encontramos tratamentos qualificados gratuitos, não há vagas e as filas são enormes. Eu vejo a necessidade dos pais também receberem apoio psicológico, sendo desgastante principalmente nos casos onde só existe a mãe 24 horas. É uma renúncia completa.
Com relação a minhas expectativas no Brasil diante do olhar em relação ao autismo, estamos caminhando a conta-gotas. Não possuímos atendimento público efetivo em nenhum dos segmentos que o autismo requer, não possuímos escolas adequadas com estruturas necessárias, não possuímos centros de atendimento multidisciplinar. Os professores não estão capacitados com qualificação para receber essas crianças, não há interesse do governo em aparelhar a educação e a saúde para a real inclusão dessas crianças. Enfim, a realidade brasileira deixa muito a desejar em todos os aspectos quando o assunto é autismo.
Apesar das semelhanças comportamentais dos portadores de autismo, a singularidade é um dos fatores do difícil diagnóstico. Eu sou grata a Deus por estar recebendo o apoio nutricional da instituição onde meu filho está frequentando atualmente (Lumen et fides), e aguardo uma vaga para o tratamento e acompanhamento integral.
Minha fé me fortalece em continuar a caminhada árdua, porque a palavra-chave é o amor, a paciência e a esperança de conseguir ensinar o Théo a ser um adulto independente. É primordial que as famílias, os pais, saiam da zona de conforto e combatam o bom combate! Isso define conviver com uma pessoa com autismo!” Claudia Cassiano, mãe do Théo, 8 anos.
Agradecimentos:
Fotos: Arquivo pessoal dos entrevistados
Arte/capa: Alecksey Willians
Revisão: Jackson Liasch (fone (43) 99944-4848 – e-mail: jackson.liasch@gmail.com
Antenor Ribeiro diz
Uma matéria assim toca a sensibilidade de quem já ignorou autistas e conscientiza da importância de conhecer um pouco mais o assunto. É de Utilidade Pública. Em algum momento da vida poderemos precisar do que foi ensinado nesta matéria. Parabéns!
Renata S. Cassiano diz
Excelente matéria Claudia. Realmente a sociedade precisa estar informada sobre o autismo. Já presenciei cenas onde o desconhecimento leva a julgamentos totalmente equivocados. Parabéns pela iniciativa!!!
Claudia Costa diz
Obrigada Renata pelo apoio e incentivo. Acreditamos que a informação pode auxiliar na inclusão e para diminuir o preconceito por desconhecimento das pessoas sobre os fatos. abraços