
Por Antônio Mariano Júnior
Tão bonito que as moças, nove em cada dez, o chamavam de pão.
Era rico, ainda por cima. Muitas queimaram a batata da perna
no escapamento da motoca. Muitas embaçaram os vidros
do Passat. O pão era gostoso.
(…)
Tão bonita que os rapazes, nove em cada dez, se derretiam
com as mãos, em demorados banhos. Filha única, abastada família.
Adorava Ponche de vinho com abacaxi. Fazia de um
tudo quando revirada do juízo. Sabia amoitar segredos.
(…)
Os bonitos, certa noite, no baile de aniversário da Cidade,
conversaram num cantinho. Ele sentiu a fragrância Contouré
vinda dela; ela coçou o nariz com o Lancaster excessivo vindo dele.
(…)

Casaram-se.
Uma beleza de cerimônia, dois bons partidos.
(…)
Cuidava dos negócios da família.
Cuidava apenas daquele reino, o lar.
(…)
Dois filhos, um menino e uma menina.
O menino, a cara do pai.
A menina, a cara da mãe.
(…)
Lá pelas tantas, em que a feição da mesmice
dava as caras, celebraram Bodas de Prata.
Foi Liiiinnnnnda a cerimônia.
(…)
Projetaram um filme na parede do Clube com alguns momentos lindos e felizes do casal e dos filhos e da interação com os munícipes e aqueles momentos em que todos riem muito: ele vestido de mulher num carnaval com os amigos e ela de melindrosa e piteira no colo de um outro pão da cidade.
(…)
Renovaram os votos e prosseguiram.
A boniteza ainda estampava as feições.
(…)
Quatro netos, três homens e uma princesinha.
(…)

O marido pecava escondido. Sabia pecar gostoso.
Quase se rendeu a um amor que não ousa dizer o nome.
A esposa era dada. Sabia amar o próximo
com força e com vontade.
(…)
O número de telefone, anotado num papel,
foi avassalador. Um número familiar, talvez.
Discou de um telefone público.
Aquela voz, quem está falando, de onde fala, alô, alô!
(…)
Trinta anos de bodas de alguma coisa,
juntos para a vida toda.
(…)
Projetaram um filme na parede do Buffet com momentos lindos e felizes do casal e dos filhos e de membros da sociedade civil organizada e depoimentos emocionantes de amigos e amigas e autoridades e fotos com os netos e a princesa e cada paisagem deslumbrante dos e os caribes e das europas.
(…)
Aquela foto.
Os quatro no estrangeiro.
Um mais bonito que o outro.
Juntos, misturados e fotogênicos.
(…)
Íntimos de longa data.
(…)
As más línguas, outrora queimadas por escapamentos,
afirmam que o quarteto se abraça nas fotos desde
os tempos em que se rodava o cano da antena para
manter boa imagem da Telefunken.
(…)
A voz ao telefone público e o colo macio como miolo de pão continham marcas de escapamentos e hálitos de vinho com abacaxi, em locais distintos.
(…)
Separaram-se, oficialmente.
Tornaram-se amigos extremamente íntimos;
esfregavam-se no colchão, quando em vez.
(…)
O marido arrumou uma namorada.
A esposa arrumou um namorado.
(…)
Cada qual com seu cada qual e pronto.
Ou esperavam um desfecho previsível?
Não, nada demais.
(…)
Os mais íntimos dizem que estão felizes.
Grisalhos, definidos, pungentes.
Bonitos.
(…)
Os quatro.
(…)
Viajam sempre para o estrangeiro.
Possuem negócios nas europas.
Namorada e namorada os levam ao aeroporto.
(…)
Na cidadeuropeia, a melindrosa, um pouco mais avolumada,
bonito traje, distribui pão e vinho aos seus.
Os três outros fartam-se.
(…)
Um pôr do sol mais bonito que o outro.
Uma lua mais bonita que a outra.
Os elementos roçam-se.
Os quatro.
(…)
As fotos não mentem jamais.



Lindo! Parabéns amigo Mariano!Bj.
Muitíssimo obrigado pelo carinho sempre,amiga Fatima Freitas. Você tem meu respeito e minha admiração! Um beijo,flor